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Mostrando postagens de 2016

Melhor que tarja preta

Vou escrevendo, que escrevendo vou inspirando, que inspirando vou expirando, que expirando vou respirando, que respirando vou me acalmando, que me acalmando eu voo e voo e voo...

Proibida a entrada de entranhas

Tudo são distrações. Tudo. Há um cuidado, um sutil cuidado, para que você se mantenha assim, distraidamente na superfície, feito a criança que cessa o choro ao menor contato dos sentidos. Porque é proibido olhar, ouvir, tatear para dentro. No entanto, veja. Não há como deixar de ser essa criança. Temos de sê-la. Mas apenas quando ela chora incansavelmente, porque intimamente sabe que o buraco no peito, só o colo acolhedor da mãe pode tapar. Sim, é permitida sim a entrada de entranhas. Dizer não a tudo o que é miseravelmente efêmero e barato é a chave.

Peito rasgado

No dia de tristeza aguda, não há lenço que estanque o choro. Mudeza fria de um coração açoitado, o silêncio é cortante. Invado sua sala. Você sentado na poltrona é minha linha de chegada. Me prostro ao chão. Caio em prantos. Entrego minha dor num envelope extraviado, violado, sujo. Me entrego.

O que fazer quando não há o que fazer?

Evito que você vire vício. Viro a página assim que percebo o disco furado da leitura numa mesma linha incontáveis vezes porque você está ali, em mim. A imprevisão do shuffle me assusta sempre que a música que me lembra você toca inesperadamente. Passo pra frente. E passo quantas vezes for preciso, até encontrar a canção que me cause riso. Evito que você vire vício. Vejo flores em vasos vazios e vou molhá-las. Imagino coisas para fazer. Afinal, o que não falta no mundo é coisa para fazer. Mas fazer o quê, se eu não consigo parar de pensar em você?

Consulta

Na sala-de-estar-sem-nada-para-fazer da consulta, pacientes chamadas pelo nome. Na minha espera avessa a revistas, tudo cuidadosamente anotado. Keiti Kelly. Alana Verônica. Mara Maria. Vânia Paula. Marcela Priscila. Marcela Priscila? Chamaram por Marcela Priscila? Só pode ser eu.

Escuta o que toca seu coração

Nada me eleva mais do que você. Vou longe. Voo muito longe. Para algum lugar fora do meu próprio alcance. Ao mesmo tempo, nada me declina mais do que você. Aprofundo a superfície. Me percorro subterrânea, respiro terra, engasgo dor. A voz não sai. A voz simplesmente não sai. Grito pra dentro um desespero silencioso. Tem alguém aí? O coração, mesmo fatigado, responde: eu, Marcela. Eu ainda estou.

Liquidação do ano velho

Começou a liquidação do ano velho. Tudo crível, tudo perdível. Afinal, a pergunta não é o que eu quero ganhar em 2017. Mas o que eu quero deixar em 2016. Muita coisa, respondo. Deixo tudo de graça e não me cobro nada por isso. Me dou descontos porque só eu sei o quanto este ano foi difícil. Mantenho à vista o coração em paz. A prazo, a vontade de ser uma pessoa melhor comigo mesma (e assim, automaticamente, com os outros). Essa é minha condição. E então aos poucos vou saindo. De sacolas leves, gratidão embrulhada para presente e sem dívidas nenhuma comigo mesma.

Por aí

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Foto: Thiago Ventura - Vai aonde, Passarinho? - Voo por aí.

A vida é como um rolo de Durex. Muitas vezes é difícil achar a ponta

Círculo vicioso. Giradas ininterruptas. Viradas e mais viradas --nunca de jogo ou de mesa. Perde-se muito perdendo a ponta da fita desse rolo que é a vida. Perde-se a conexão consigo mesmo. E o tempo usado para encontrá-la nunca é gasto. Nunca é desperdiçado. Afinal, o que é a vida senão o desafio diário de mantermos a ponta sempre visível? Façamos estratégias para conservá-la assim. E lancemos mão de técnicas para reencontrá-la, sempre. A internet dá sua contribuição (embora para rolos não tão complicados). Eis algumas formas de encontrar a ponta perdida. 1. Examine o rolo bem de perto. Ou: onde foi que perdemos e/ou deixamos que ultrapassassem o nosso limite? 2. Considere a possibilidade de a ponta não estar tão obviamente reta. Talvez não seja tão fácil assim identificar esse limite. Uma autorreflexão séria e uma conversa franca com o coração podem ser bem-vindas. 3. Passe as pontas dos dedos pelo rolo. Tenhamos tato. Mas que não sejamos tão sensíveis. Encaremos o problema ...

Zumbis

Eles seguem todos de lá pra cá. De lá, da casa deles, pra cá, pro trabalho deles. De lá, cegos pelos seus apegos. Pra cá, aprisionados por seus medos. De lá pra cá. De lá pra cá. Um dia, no meio do caminho, encontraram uma pedra. Uma pedra no meio do caminho. Chutaram pra longe. E pra longe foi a vida deles. Viraram zumbis.

Dalton, K.

Quando conheci Karen, ela tinha uma choro contido na voz. Sua voz era melodiosa, feito barulho de chuva na madrugada. Havia muita dor para cantar. Por isso ela cantava tanto. Tão lindamente.

Calma

Você desconta no trânsito. Desconta no porteiro do prédio. Desconta na comida. Desconta no cigarro. Desconta na bebida. Desconta na sexta-feira. Desconta na segunda-feira. Desconta, desconta, desconta. Calma! E você? Dá um desconto pra você.

Pequenas felicidades

Só uma coisa. Algo simples. Aparentemente banal. Mas que pra você seja importante. Faça pelo menos uma coisa assim no seu dia. E já será uma conquista. O suficiente para animá-lo, encorajá-lo, fortalecê-lo.

Drama

À noite, quando eu chego em casa, tenho meus quinze minutos de drama. O drama de precisar tirar imediatamente tudo o que esteve grudado em mim ao longo do dia. Removo os brincos e o relógio. Troco o sapato pelo chinelo. Jogo longe o sutiã e a calça. Acendo todos os abajures e, por fim, ligo a tevê. Gosto de me sentir livre, de ver minha casa iluminada, de ouvir que não estou sozinha. Vou para a cozinha. Preparo algo para comer. Com o prato em mãos, volto para a sala. O tempo do jornal dura o tempo de eu comer a refeição. Descanso por alguns minutos. Então, me levanto e começo meus novos quinze minutos de drama. O drama de precisar arrumar tudo o que eu desarrumei.

Só algumas horas

De tudo o que te irrita, te entristece, te angustia. De tudo o que te consome, as paixões, os desejos, as vontades. De tudo o que te incomoda, a monotonia, a letargia, a disritmia. Tudo, absolutamente tudo, dura apenas algumas horas. Só algumas horas. Não são horas infinitas. São apenas horas. Contadas no mesmo beat, na mesma velocidade, no mesmo compasso das horas boas. Aliás, e o que são as horas boas, senão o estar presente, integralmente presente, na hora exata, neste instante?

Maturidade em rimas

Quando criança, esperança. Quando adolescência, impaciência. Quando adulto, autoindulto. Quando idoso, ocioso.

Peso leve

O piano já não é mais de cauda. A cruz parece feita de mdf. E o mundo virou uma grande bola de pilates. O peso nas costas agora é a criança que passeia sentada nos ombros. Leve, livre. Nossa única obrigação é mantê-la ali, equilibrada, segura o suficiente para não cair.

Boiando na vida

Muitos somos como a garrafa vazia na superfície suja do mar. Boiamos profundamente solitários, adormecidos no balanço das ondas. Ondas de desejos que vão e que vêm sem parar. E que, intimamente sabemos, não nos levam a nenhum lugar. Boiamos em nossa própria vida. A gente se deixa levar. Ou vamos levando, como dizem por aí. Isso dá enjoos. Enjoa muito. Mas será que, como garrafas no mar, estamos assim tão vazias? Veja bem. Há um papel dentro. Uma mensagem. É pra você. E olha! Foi você mesmo quem escreveu. E aí, o que está escrito?

Não há Sonrisal que cure

Vida vazia dá azia.

Looping

Mesmo com a playlist repleta de músicas novas, o shuffle sempre me leva a canções antigas. Segue uma por uma, como se fossem placas de uma estrada com destino à felicidade. E não está errado. O problema é que aquela felicidade deu lugar à saudade. E a possibilidade de perder a viagem é grande. Mas tudo bem. Até podemos perder a viagem, shuffle. O importante é não perder o rumo.

Gratidão

Das coisas que me são queridas há também feridas. Profundas e rasas, sempre bem-vindas. Me são necessárias. E, graças a Deus, temporárias.

Sexta-feira

Às sextas, tudo é ensejo para o desejo. Garçom! Traga-me o que é fútil. Amanhã não é dia útil.

Já é hora

Já não posso mais ser como antes. Não consigo. Desejos por cerveja, sexo, saídas e tudo o mais que dê uma trégua pra mente. Tudo isso me soa fora da realidade. Sinto que preciso encarar de frente os anseios que me deixam mal física e psicologicamente no dia seguinte. Nada e ninguém pode me ajudar ou preencher meu coração a não ser eu mesma com minha própria solidão. Chegou a hora de me enfrentar. De não fugir mais de mim. Já não posso mais negligenciar isso.

Parece promessa

Prece que tem pressa perece, padece, anoitece. No breu.

Desvirtualizou

Antes, a gente compartilhava sonhos. Hoje, só posts.  

Palhaça de mim mesma

De tempos em tempos eu invento uma bobagem qualquer para fazer rir a mim mesma. Eu rio sem que ninguém me ouça. A gargalhada muda invade um espaço vazio dentro de mim. Um espaço que era pra ser seu. Eu rio para não chorar. E quando isso acontece, não é a barriga que dói. É o coração.

Eu te pergunto

E lá se vai mais um mês. E o que foi que você fez?

Danúbio Azul

Domingo era o dia que meu pai mais gostava. Como de costume, ele acordava cedo e ia comprar jornais. Eu, no alto dos meus quatro anos, sempre o acompanhava. Ele comprava um jornal local e um nacional. E dois gibis da Turma da Mônica pra mim. Quando chegávamos em casa, ele ligava o som bem alto. Chico Buarque, Paulinho da Viola, Edith Piaf e, entre tantas outras, Danúbio Azul. Acho que essa era a sua música preferida. Eu e meus irmãos adorávamos. Domingo era sempre um dia muito especial. Meu pai faleceu num domingo de manhã. O dia estava lindo. O céu completamente azul. Como ele gostava. Isso faz pouco mais de sete anos. Eu nunca mais tinha escutado Danúbio Azul. De uns tempos pra cá, voltei a ouvi-la. E hoje, com a saudade imensa que sempre sinto dele, fiquei com vontade de compartilhar. É linda demais.

Do amor líquido que escorre pelas mãos

O produto chega até você de maneira aparentemente impecável. Não houve extravio, tampouco foi violado. Você desejou e esperou muito por esse momento. Ao primeiro contato visual, a primeira impressão: não era o que você imaginava. Mas, ok. Quem disse que tem que ser amor à primeira vista? Ao segundo contato, novas revelações: podia ser melhor. Por fim, um defeito. Mais especificamente no dedo anelar da mão esquerda. Era casado. Próximo.

Essa foi por pouco

Por pouco cuidado. Pouco caso. Pouca atenção. Pouca atitude. Pouca vontade. Pouca consideração. Por pouco não ficamos juntos.

Por quê?

Até onde é amor? Até onde é apego? Até onde é sossego ou medo? Coração, me diz! Se eu sou mesmo tão feliz, por que a angústia me tomou e a tristeza pairou feito sombra sobre mim?

Em tempo

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"Sol posto, hora de melancolia." Meu fuso é diferente do de Machado de Assis. Começa mais cedo. De tarde, hora da saudade. Foto: Thiago Ventura ( https://www.flickr.com/photos/thiagoventura )

Sim

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A noite é uma criança. Pode chorar. Foto: Thiago Ventura ( https://www.flickr.com/photos/thiagoventura )

Tem que ter tempero

Quando eu gosto, gosto com gosto.

Devagar com a dor

Alguns corações têm mãos. Mãos de tesoura. Só sabem escrever rasgando o verbo, despedaçando outros corações.

Vem

Eu não sei o que você está fazendo agora que ainda não me procurou. Eu não sei o que você fez ontem que ainda não me procurou. Mas mantenho seu presente dentro da caixa. Mantenho também algumas coisas que você deixou. A escova de dentes no armário do banheiro. E a minha vontade de você. Eu não sei o que você anda fazendo que ainda não me procurou. Te espero. E espero. Que não seja tarde demais.

Tomara

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Que o seu amor floresça. E a gente aconteça. Foto: Thiago Ventura ( https://www.flickr.com/photos/thiagoventura )

Da dualidade da vida

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Não se pode ter dois céus. Tudo é escolha. E não há garantias que dessas escolhas sairemos ilesos, sem dor, sem tristezas. Mas podemos sair em paz. Com o coração em paz. Em harmonia com a nossa verdade. Em equilíbrio com o nosso amor-próprio. Certos de que não fizemos mal para ninguém. Nem para nós mesmos. Foto: Thiago Ventura ( https://www.flickr.com/photos/thiagoventura )

De cristal

De repente, não mais que de repente, você ficou ausente. E a ausência, a gente sabe, sempre quebra alguma coisa.