Postagens

Mostrando postagens de dezembro, 2016

Melhor que tarja preta

Vou escrevendo, que escrevendo vou inspirando, que inspirando vou expirando, que expirando vou respirando, que respirando vou me acalmando, que me acalmando eu voo e voo e voo...

Proibida a entrada de entranhas

Tudo são distrações. Tudo. Há um cuidado, um sutil cuidado, para que você se mantenha assim, distraidamente na superfície, feito a criança que cessa o choro ao menor contato dos sentidos. Porque é proibido olhar, ouvir, tatear para dentro. No entanto, veja. Não há como deixar de ser essa criança. Temos de sê-la. Mas apenas quando ela chora incansavelmente, porque intimamente sabe que o buraco no peito, só o colo acolhedor da mãe pode tapar. Sim, é permitida sim a entrada de entranhas. Dizer não a tudo o que é miseravelmente efêmero e barato é a chave.

Peito rasgado

No dia de tristeza aguda, não há lenço que estanque o choro. Mudeza fria de um coração açoitado, o silêncio é cortante. Invado sua sala. Você sentado na poltrona é minha linha de chegada. Me prostro ao chão. Caio em prantos. Entrego minha dor num envelope extraviado, violado, sujo. Me entrego.

O que fazer quando não há o que fazer?

Evito que você vire vício. Viro a página assim que percebo o disco furado da leitura numa mesma linha incontáveis vezes porque você está ali, em mim. A imprevisão do shuffle me assusta sempre que a música que me lembra você toca inesperadamente. Passo pra frente. E passo quantas vezes for preciso, até encontrar a canção que me cause riso. Evito que você vire vício. Vejo flores em vasos vazios e vou molhá-las. Imagino coisas para fazer. Afinal, o que não falta no mundo é coisa para fazer. Mas fazer o quê, se eu não consigo parar de pensar em você?

Consulta

Na sala-de-estar-sem-nada-para-fazer da consulta, pacientes chamadas pelo nome. Na minha espera avessa a revistas, tudo cuidadosamente anotado. Keiti Kelly. Alana Verônica. Mara Maria. Vânia Paula. Marcela Priscila. Marcela Priscila? Chamaram por Marcela Priscila? Só pode ser eu.

Escuta o que toca seu coração

Nada me eleva mais do que você. Vou longe. Voo muito longe. Para algum lugar fora do meu próprio alcance. Ao mesmo tempo, nada me declina mais do que você. Aprofundo a superfície. Me percorro subterrânea, respiro terra, engasgo dor. A voz não sai. A voz simplesmente não sai. Grito pra dentro um desespero silencioso. Tem alguém aí? O coração, mesmo fatigado, responde: eu, Marcela. Eu ainda estou.